Se você ainda não viu o documentário Minimalism do Netflix, fica aqui o convite. É muito bacana. Nele, os intitulados minimalistas Joshua Fields Millburn e Ryan Nicodemus contam um pouco sobre sua trajetória e os desafios da vida e infância que os levaram até este estilo desapegado de vida. No filme viajamos com eles em uma turnê para promover seu livro e as ideias da dupla, ainda no início da empreitada (agora já com milhões de leitores). 

A proposta é de certa forma radical, ao estilo de Mogli e Balu (se lembrar pode cantar junto: o necessário, somente o necessário, o extraordinário é demaaaaisss), mas talvez justa frente ao consumismo desenfreado que vivemos. Isso parece ainda mais latente quando se vê a loucura do estilo de vida americano, em que cada vez aparece algo sem o qual não conseguiremos mais sobreviver ao dia de amanhã. 

Mas não escapo por não ser americana. Sonho com milhares de bugigangas sem utilidade e produzo uma quantidade assustadora de lixo todas as semanas. Assim, quando veio a ideia de nos mudarmos, pensamos logo no quanto esse desapego seria importante e no quanto poderíamos usar deste momento para começar do zero uma vida novinha em folha, só com o que importa.

E como tudo nessa vida, a teoria se mostrou bem mais simples que a prática.

Ao empacotar nossa casa chorei várias vezes. Nos brinquedos doados as lembranças das risadas da minha filha. Nas minhas roupas os dias que saí voando baixo para conquistar o mundo. Nas louças que ganhei como presente de casamento há mais de 10 anos, o gostinho dos jantares com os amigos - ainda que muitas esperassem singelas e inertes por serem usadas.

Caixa após caixa a vida ia passando. Como é difícil desapegar. Pra cada apego eu ouvia do meu marido: “são só coisas, não somos nós”. Mas elas parecem insistir a todo o tempo para se ensoparem de gente. 

Nosso último dia em casa, com todas as coisas em seus lugares certos, foi o último dia de conforto e aconchego. De certeza, da paz que o apego traz. Casa vazia é corpo sem alma. Precisa preencher. Mas, como diria a vó Má Tereza “quem não morre não vê Deus”, numa espécie de “você precisa passar por uns mal bocados para que coisas boas aconteçam” ou “é preciso deixar o velho ir para abrir espaço para o novo”. Veja que isso vale também para fossa de término de namoro.

Começamos então vida nova. E realmente dessa vida de expatriado nada se leva, só alguma roupa mesmo. Então começaram as listas: falta ralador, concha, pegador. E talvez uma mesinha aqui, tapete, porta treco. Opa! Mas já tem treco?! Bééé! Falta! Olha nós aí de novo juntando coisa! 

A JoutJout Prazer fez um vídeo muito legal falando sobre isso. Vale a pena dar uma olhada, até porque sempre se dá algumas risadas com ela.


Faz tempo que eu queria ser feliz como o Marcelo Camelo quando canta “Viver conforme o que vier, Só precisar do que eu tiver”, mas parece que o negócio de estar respirando é que sempre faltará algo.

Parece que seremos felizes quando terminarmos aquela pós, quando os filhos crescerem, quando terminarmos de pagar o carro ou quando os móveis planejados da cozinha chegarem.

Empacotando vi que eu tinha mais de 40 pares de calças e 80 sapatos! É mesmo demais. Cheguei a conclusão de que preciso de uma mala do tamanho que eu possa carregar. Ou seja, que precisamos sim de certo conforto e alguns objetos e coisas que nos ajudem a acalentar a alma. Mas, se eles não couberem na mala sei que ficarão por aí e que portanto, darei para eles uma última olhada de gratidão e adeus. Outros, quero ter comigo ou saber que estão seguros em algum lugar do mundo  (casa da mãe?), como a primeira roupinha dos meus bebês, totalmente sem utilidade mas carregadas de boas vibrações. 

Sempre tem espaço para uma fofurice :)

Para as minhas listas agora, generosamente dou alguns dias de repouso, para que tenham a chance de se mostrarem merecedoras. As vezes fecho os olhos e me lembro com saudades da minha casa, seus cantinhos tão familiares de armários cheios. Era o espaço delimitado e material da minha zona de conforto.

Mas confesso que na casa nova sinto um certo descanso quando vejo que em menos de uma hora consigo contar todos os itens que ela guarda, sabendo que não os preciso em maior quantidade. Não temos armários lotados de coisas a serem reorganizadas em cada estação. Não tenho pilhas e pilhas de toalhas, mesmo insistindo em usar somente a primeira que a mão alcança. Ou mesmo aquelas coisas que guardamos sem razão como fantasias de festa junina e cadernos da escola primária

Afinal, roupa se lava e usamos de novo. Louças precisamos na medida dos moradores da casa. E o resto se resolve conforme a necessidade. Não precisamos de tanto no final do dia.

A essa nova categoria resolvi batizar de apego funcional, que para mim significa gostar daquilo que tem uma função prática na vida ou, em último caso, no coração. 

Te encorajo a tentar, não é fácil, mas quem sabe uma faxina anual seja uma boa ideia para começar com bons fluídos. Parece que as ideias se organizam melhor por dentro quando há mais espaço para correrem soltas do lado de fora. De repente abrir mão do velho de fato crie espaço para o novo, e doando o que já não se usa você faz alguém feliz. Aliás, as trocas e as doações são também uma nova faceta desta nova vida. Mas este é um assunto para outro desapego.

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